Independência ou nada
Sou um sujeito bem brasileiro. Desses que vibrou e chorou com as vitórias e depois com a morte do Airton Senna, que se indignou com a venda/ doação da Vale do Rio Doce e do Sistema de Telecomunicação do país, que torce, discute, xinga o juiz, defendendo o seu clube de futebol, que foi para as ruas pedir Diretas Já!, que fica besta olhando o mar... Acho que, ao meu modo, sou um patriota.
Bem, ser patriota na época da ditadura, por exemplo, tinha um significado completamente diferente. O Sete de Setembro era imposto para todos. Havia convocação no rádio e na televisão para que assistíssemos à Parada Militar. Os nossos heróis oficiais não convenciam muito, mas nós feriávamos alegres. E olha que nós torcemos pelo ídolo da classe trabalhadora, que começou como uma sigla depois virou presidente. Nós, tão pobres de heróis e com tantos ídolos forjados pela tela maravilhosa da tv ou do cinema, embora tão efêmeros, pois feitos de ilusão. Fabricamos um herói de barba como papai Noel.
No Sete de Setembro vestíamos a roupa de domingo e, segurando a mão do pai, íamos acenar na Parada com a bandeirinha do Brasil. Veio a liberdade, após a anistia, e nós não nos obrigamos mais a ver soldados marcharem. O tempo foi passando e nós assistimos o país entrar no processo de globalização pela porta dos fundos. É, somos obedientes e ficamos na cozinha da civilização, espiando de longe a festa do Primeiro Mundo. Cumprimos todas as ordens. Seguimos a cartilha do ABC Internacional que tem outras letras, FMI, BID, USA, ALCA, ONU, OEA etc., êpa, parece que essas siglas estão interligadas!!!
Eu, como ilegítimo devedor das dívidas externa e interna, estou preocupado com a possibilidade de perdermos a autonomia sobre a Amazônia, o resto da mata nativa nordestina, os recursos naturais que estão cada vez mais escassos, podendo interferir na sobrevivência humana pela escassez de água, principalmente nas regiões mais desérticas da terra.
Vejamos o por quê? Os usineiros que deviam dinheiro aos bancos deram calote e foram premiados com o perdão da dívida; os banqueiros fraudulentos que desviaram dinheiro foram socorridos. Os sonegadores de impostos, os cartelistas dos remédios, das distribuidoras de combustível estão sorrindo para o povo desdentado. A quadrilha que quebrou a previdência e lesou a pátria corrompida está se abanado com dólares nos paraísos fiscais. E, pasmem, alguns heróis do tempo da ditadura, defensores da ética da revolução, hoje estão no bando dos réus do mensalão, são porcos fuçando na gamela cheia do poder. Meu país tão grande e tão menino, esse Brasilzão que não enjoa de ser rico e de ter tanto pobre se tornando miserável.
D. Pedro gritou errado. “Independência ou morte” é uma frase que não se aplica ao brasileiro, que não é capaz de morrer pela pátria. Resultado: como ninguém queria morrer, a pátria deixou o fauno decadente da história brasileira voltar para Portugal. Melhor seria se o príncipe tivesse dito: Independência ou Nada. Afinal, nos sobrou muita dependência e não temos nada mesmo. Preciso de uma saída para nossa crise existencial. Vou ao Banco do Brasil fazer um empréstimo para cuidar da minha aparência de servidor público. Vou ao Shopping ver as novidades em celular e computador, para me sentir um pouco menos alienado. Preciso de terapia urgente. Quero me consultar com um anão do orçamento, um fraudador do INSS, um torturador em busca de dólares, um desses deputados amestrados do ex-FHC ou desses do Lula, que regateiam mensalão afrontando a pobreza que assola. Quem sabe eles me convencem que a honestidade não vale a pena, que a ética é só um devaneio da filosofia, que esse país é um circo e eu um grande otário disfarçado de intelectual!
A propósito, no próximo dia 7 de setembro, vou me fantasiar de D. Pedro I. Vou subir num jegue e, com a minha espada de madeira, gritar para o mundo: Independência ou nada!
Gildemar Pontes - gilpoeta@yahoo.it Escritor, Professor de Literatura da UFCG, Coordenador do Projeto Mãos à Arte. Editor da Revista Acauã, Diretor Administrativo da Associação Bushinkan de Karatê – ABK. Presidente da Associação dos Artistas de Cajazeiras – AARC@. Tem 16 livros publicados, já foi traduzido para o Espanhol e publicado em Cuba.
Bem, ser patriota na época da ditadura, por exemplo, tinha um significado completamente diferente. O Sete de Setembro era imposto para todos. Havia convocação no rádio e na televisão para que assistíssemos à Parada Militar. Os nossos heróis oficiais não convenciam muito, mas nós feriávamos alegres. E olha que nós torcemos pelo ídolo da classe trabalhadora, que começou como uma sigla depois virou presidente. Nós, tão pobres de heróis e com tantos ídolos forjados pela tela maravilhosa da tv ou do cinema, embora tão efêmeros, pois feitos de ilusão. Fabricamos um herói de barba como papai Noel.
No Sete de Setembro vestíamos a roupa de domingo e, segurando a mão do pai, íamos acenar na Parada com a bandeirinha do Brasil. Veio a liberdade, após a anistia, e nós não nos obrigamos mais a ver soldados marcharem. O tempo foi passando e nós assistimos o país entrar no processo de globalização pela porta dos fundos. É, somos obedientes e ficamos na cozinha da civilização, espiando de longe a festa do Primeiro Mundo. Cumprimos todas as ordens. Seguimos a cartilha do ABC Internacional que tem outras letras, FMI, BID, USA, ALCA, ONU, OEA etc., êpa, parece que essas siglas estão interligadas!!!
Eu, como ilegítimo devedor das dívidas externa e interna, estou preocupado com a possibilidade de perdermos a autonomia sobre a Amazônia, o resto da mata nativa nordestina, os recursos naturais que estão cada vez mais escassos, podendo interferir na sobrevivência humana pela escassez de água, principalmente nas regiões mais desérticas da terra.
Vejamos o por quê? Os usineiros que deviam dinheiro aos bancos deram calote e foram premiados com o perdão da dívida; os banqueiros fraudulentos que desviaram dinheiro foram socorridos. Os sonegadores de impostos, os cartelistas dos remédios, das distribuidoras de combustível estão sorrindo para o povo desdentado. A quadrilha que quebrou a previdência e lesou a pátria corrompida está se abanado com dólares nos paraísos fiscais. E, pasmem, alguns heróis do tempo da ditadura, defensores da ética da revolução, hoje estão no bando dos réus do mensalão, são porcos fuçando na gamela cheia do poder. Meu país tão grande e tão menino, esse Brasilzão que não enjoa de ser rico e de ter tanto pobre se tornando miserável.
D. Pedro gritou errado. “Independência ou morte” é uma frase que não se aplica ao brasileiro, que não é capaz de morrer pela pátria. Resultado: como ninguém queria morrer, a pátria deixou o fauno decadente da história brasileira voltar para Portugal. Melhor seria se o príncipe tivesse dito: Independência ou Nada. Afinal, nos sobrou muita dependência e não temos nada mesmo. Preciso de uma saída para nossa crise existencial. Vou ao Banco do Brasil fazer um empréstimo para cuidar da minha aparência de servidor público. Vou ao Shopping ver as novidades em celular e computador, para me sentir um pouco menos alienado. Preciso de terapia urgente. Quero me consultar com um anão do orçamento, um fraudador do INSS, um torturador em busca de dólares, um desses deputados amestrados do ex-FHC ou desses do Lula, que regateiam mensalão afrontando a pobreza que assola. Quem sabe eles me convencem que a honestidade não vale a pena, que a ética é só um devaneio da filosofia, que esse país é um circo e eu um grande otário disfarçado de intelectual!
A propósito, no próximo dia 7 de setembro, vou me fantasiar de D. Pedro I. Vou subir num jegue e, com a minha espada de madeira, gritar para o mundo: Independência ou nada!
Gildemar Pontes - gilpoeta@yahoo.it Escritor, Professor de Literatura da UFCG, Coordenador do Projeto Mãos à Arte. Editor da Revista Acauã, Diretor Administrativo da Associação Bushinkan de Karatê – ABK. Presidente da Associação dos Artistas de Cajazeiras – AARC@. Tem 16 livros publicados, já foi traduzido para o Espanhol e publicado em Cuba.
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